Resumo
- Sob a aparência de um “conflito”, o que persiste é um regime de apartheid e limpeza étnica, mantido com o apoio de potências ocidentais.
- As ofensivas militares periódicas — em 2008, 2012, 2014, 2021 e, mais brutalmente, desde Outubro de 2023 — deixaram dezenas de milhares de mortos e feridos, entre os quais uma elevada percentagem de civis e crianças.
- Entre checkpoint e checkpoint, entre sirenes e funerais, as famílias continuam a ensinar o nome das aldeias destruídas, a dança do dabke, a poesia de Mahmoud Darwish.
A ocupação da Palestina por Israel soma mais de 75 anos de violações sistemáticas do direito internacional e dos direitos humanos. Sob a aparência de um “conflito”, o que persiste é um regime de apartheid e limpeza étnica, mantido com o apoio de potências ocidentais.
Desde a fundação do Estado de Israel, em 1948, milhões de palestinianos foram forçados a deixar as suas casas. Hoje, mais de sete milhões vivem como refugiados, enquanto outros cinco milhões sobrevivem sob ocupação militar, sem cidadania plena, liberdade de movimentos ou garantias básicas. Organizações como a Amnistia Internacional, Human Rights Watch e a ONU classificam a política israelita nos territórios ocupados como apartheid — um regime de dominação de um grupo racial sobre outro, proibido pelo direito internacional.
Ocupação e colonatos ilegais
A Cisjordânia, território que deveria integrar o futuro Estado palestiniano, está hoje fragmentada em enclaves murados, vigiados por torres militares e atravessados por colonatos judaicos ilegais. Segundo dados da ONU, existem mais de 700 mil colonos israelitas instalados na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental — ambos territórios ocupados, segundo a resolução 242 do Conselho de Segurança.
Estes colonatos são frequentemente acompanhados da expulsão violenta de famílias palestinianas, da destruição de casas, da apropriação de terras agrícolas e de infra-estruturas vitais. A ONG israelita B’Tselem documenta centenas de ataques de colonos armados contra civis palestinianos, muitas vezes sob a protecção ou complacência das forças militares israelitas.
Gaza: bloqueio, bombardeamentos e colapso humanitário
Na Faixa de Gaza, cerca de 2,3 milhões de pessoas vivem num enclave sitiado por terra, ar e mar desde 2007. Israel controla o espaço aéreo, as fronteiras, a entrada de bens essenciais e até o fornecimento de energia. Este bloqueio, denunciado como punição colectiva, transformou Gaza numa prisão a céu aberto.
As ofensivas militares periódicas — em 2008, 2012, 2014, 2021 e, mais brutalmente, desde Outubro de 2023 — deixaram dezenas de milhares de mortos e feridos, entre os quais uma elevada percentagem de civis e crianças. Infra-estruturas hospitalares, escolas, mesquitas e até abrigos da ONU foram bombardeados. A destruição do sistema de saúde e o colapso do abastecimento alimentam uma crise humanitária de proporções catastróficas.
Regime de apartheid: denúncias crescentes
Em 2022, a Amnistia Internacional publicou um relatório exaustivo em que afirma, sem equívocos, que “Israel impõe um sistema de opressão e dominação racial aos palestinianos em todos os territórios sob o seu controlo”. A Human Rights Watch chegou à mesma conclusão, e até personalidades israelitas, como o ex-Procurador-Geral Michael Ben-Yair, reconhecem que “Israel é hoje um Estado de apartheid”.
Entre as práticas apontadas contam-se: leis de segregação, zonas de circulação exclusivas para judeus israelitas, detenções administrativas sem acusação nem julgamento, demolição sistemática de casas palestinianas, restrições ao acesso à água e ao território.
Resistência, narrativa e cumplicidade
Perante esta realidade, os palestinianos resistem. Com pedras, com palavras, com a cultura, com a memória. Movimentos como o BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções) ganham força em universidades, sindicatos e parlamentos, exigindo o fim do apoio internacional à ocupação israelita. A resposta de Telavive tem sido a criminalização do protesto, campanhas de difamação e, nalguns casos, mesmo o assassinato selectivo de líderes civis.
O papel das potências ocidentais permanece ambíguo: enquanto apelam à “moderação” e defendem negociações, continuam a fornecer armas, tecnologia e apoio diplomático ao governo israelita. Os Estados Unidos vetaram dezenas de resoluções da ONU que visavam proteger os direitos dos palestinianos. A União Europeia, por sua vez, mantém acordos comerciais com Israel, apesar das evidências de violações massivas de direitos humanos.
Um povo sem Estado, mas com identidade
Apesar de tudo, a Palestina persiste. Nas ruas de Ramallah, nas ruínas de Gaza, nos campos de refugiados da Jordânia ou do Líbano, ouve-se a mesma palavra: sumud — resistência. Entre checkpoint e checkpoint, entre sirenes e funerais, as famílias continuam a ensinar o nome das aldeias destruídas, a dança do dabke, a poesia de Mahmoud Darwish.
“Não temos tanques nem exércitos. Mas temos raízes”, diz Mariam, professora de História em Nablus. É essa memória colectiva — feita de exílios, intifadas, mas também de esperança — que mantém viva a luta por justiça, autodeterminação e regresso.